Capítulo 2: Como evitar o rotativo e manter o controle do cartão: técnicas práticas para escapar dos juros abusivos

Com total honestidade, poucas palavras têm causado mais prejuízo silencioso às finanças dos brasileiros do que “rotativo”. É um termo que parece técnico, distante — e é justamente essa distância que o torna perigoso. Porque quem paga apenas o mínimo da fatura do cartão de crédito, ativa automaticamente esse mecanismo, com taxas que ultrapassam qualquer bom senso financeiro.
Segundo o Banco Central do Brasil, o rotativo do cartão continua sendo a modalidade de crédito com maior taxa de juros do mercado, atingindo médias superiores a 400% ao ano. Isso significa que uma dívida de R$ 1.000 pode dobrar em poucos meses, dependendo da instituição financeira e dos encargos aplicados. Não é exagero — é matemática pura. E é por isso que, antes de aprender a usar bem o cartão, é essencial aprender a evitar o rotativo.
Mas para isso, precisamos falar sobre planejamento de fatura. O primeiro passo para escapar do rotativo é encarar a fatura como parte do orçamento, e não como surpresa do mês. Isso exige que o consumidor registre todos os gastos feitos no cartão, categorizados e atualizados. Aplicativos como Mobills, Wise, ou até planilhas simples em Google Sheets são grandes aliados nessa tarefa.
O educador financeiro Gustavo Cerbasi tem uma regra que pode parecer rígida, mas funciona: “Nunca compre no cartão se você não sabe como vai pagar no vencimento.” Parece óbvio, mas a maioria das dívidas no cartão nasce justamente da ausência desse pensamento antecipado.
Espero que se entenda com clareza: evitar o rotativo não é só uma questão de pagar a fatura — é uma questão de comportamento preventivo. Para isso, compartilho aqui algumas técnicas concretas, testadas e recomendadas por especialistas:
Agenda de vencimento sincronizada com o recebimento de salário. Muitos consumidores têm o vencimento do cartão marcado para uma data que não conversa com sua entrada de renda. Solicitar ao banco a alteração dessa data pode evitar atrasos e garantir que o pagamento integral seja feito.
Acompanhamento semanal da fatura em aberto. Não espere a fatura fechar para saber o que gastou. Acompanhe em tempo real. Apps dos próprios emissores de cartão como Nubank, Inter, ou Bradesco oferecem esse recurso gratuitamente.
Limite personalizado. Não aceite o limite que o banco lhe oferece automaticamente. Solicite redução, se necessário. O ideal é que o limite do cartão fique abaixo de 50% da sua renda líquida.
Alerta de consumo. Configure notificações no seu app sempre que uma compra ultrapassar determinado valor. Esse tipo de aviso funciona como uma freada psicológica.
A professora Renata Nunes, da FEA-USP, enfatiza em seus cursos de orçamento doméstico que “o rotativo só aparece quando há ausência de planejamento real — e o plano começa com consciência diária.” Uma frase que, apesar de simples, resume a essência do controle.
Gostaria de contar aqui uma experiência recorrente em entrevistas de campo: muitos brasileiros têm vergonha de admitir que pagam apenas o mínimo. Como jornalista, ouvi diversos relatos em que o consumidor dizia não entender o sistema — achava que pagar parte já era suficiente. O problema é que os encargos são pouco explicados, e a linguagem bancária confunde mais do que informa.
Por isso, é essencial cobrar transparência dos emissores. O consumidor tem direito a saber, com clareza, quais serão os juros aplicados, os encargos diários e o saldo final em caso de pagamento parcial. A Lei do Superendividamento, aprovada em 2021, reforça essa obrigação de comunicação clara. E quando ela não acontece, vale acionar os canais de defesa do consumidor: Procon, Banco Central, ou o portal Consumidor.gov.br.
Mas nem tudo é contenção. O cartão pode ser usado estrategicamente quando bem gerido. Pagar à vista no cartão e acumular milhas, participar de programas de cashback, concentrar gastos para facilitar controle — tudo isso é possível, desde que a fatura seja tratada com seriedade. O cartão não pode ser inimigo, mas exige vigilância.
A educadora Carol Sandler, em suas oficinas sobre finanças femininas, costuma dizer que “o cartão é como uma amizade intensa: pode te levar a lugares incríveis, mas se não houver limites, pode te machucar.” É uma metáfora precisa — e que ajuda a entender o equilíbrio necessário.
Concluo este capítulo reforçando que o rotativo é uma consequência — não um destino. Quando você estrutura seu orçamento com antecedência, acompanha seus gastos com rigor e transforma o pagamento integral da fatura em prioridade, o cartão se torna ferramenta. E ferramenta, como bem sabemos, é útil quando bem operada. Seu bolso merece essa atenção.